quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Saló e Oaxiac


Finalmente consegui assistir a Saló-Os 120 Dias de Sodoma, a obra derradeira de Pier Paolo Pasolini.Particularmente nunca gostei de seus filmes,Teorema,Decameron o Evangelho Segundo São Mateus,Pocilga obras de certa forma simplistas apesar de fortemente barrocas,artesanais,mediterrâneas,imagino-as com um forte cheiro de terra molhada,de barro puro. Saló é um choque,provavelmente o filme mais incômodo já feito,não assusta pela violência e pela depravação,todas as gruesome scenes já estavam lá no Marquês de Sade,o que perturba é o contexto,os diálogos adicionais escritos por Roland Barthes,o que choca é a maldade inerente ao ser humano,é a desesperança diante da redenção ao mal que nos habita,o desejo de domínio sobre o outro,o querer a obediência cega,subjugar e submeter a vontade,seja ela sexual,econômica ou política.Saló mostra alguns burocratas na Itália fascista que sequestram um grupo de jovens,homens e mulheres,para usá-los nas mais bizarras explorações sexuais que descambam para a tortura e o assassinato.É óbvio que o filme antes de mais nada é uma metáfora política sobre o que os fascistas fizeram com a Itália,as vítimas representam o povo italiano,em dado momento um dos burocratas confessa ter matado a própria mãe,nada mais óbvio.O final do filme é estranhamente pessimista,nenhuma palavra ou sinal de punição aos facínoras,os maus sentem apenas prazer e tédio.Assistindo Saló lembrei-me de Ideologia,genial episódio do filme O Estranho Mundo de Zé do Caixão de José Mojica Marins, no filme Oaxiac Odez (interpretado por Mojica) comprova através de um experimento que os instintos são superiores a racionalidade no comportamento humano,para tanto priva um casal de água e alimentos por vários dias até que a mulher mata o marido para lhe beber o sangue e comer a carne, no final acaba sendo morta por Oaxiac que se alimenta dos restos mortais de ambos num macabro banquete.O filme acabaria assim,niilista,porém a censura militar bateu o pé e Mojica teve que incluir uma cena da casa em que acontecia o banho de sangue sendo atingida por um raio e alguns dizeres referentes a ira de Deus contra os maus,vexame artistíco do qual Pasolini escapou ileso.Mojica (seu filme é de 1968) e Pasolini (Saló 1975) realizaram dois filmes semelhantes,obras geniais sobre a estranha condição do ser humano,teria Deus o direito de fulminar com um raio suas próprias criaturas? Teria um louco de acabar com alguém como Pasolini a facadas? Claro que não,mas aos maus cabe somente o prazer e o tédio.

Um comentário:

  1. Tenho esse filme aqui no computador.
    Faz milênios que estou querendo assitir, mas o marido resiste. Ele não gosta do bizarro, mesmo que humano.
    Já eu? Viciada!

    Dei uma fuçada e achei sensacional algumas cenas. Ué, e esse não é o humano? Que domina e quer ser dominado, que submete-se e subjulga?
    O racional só é utilizado para legitimar tudo isso....por outras vias e de outra forma. Disfarçado.

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